segunda-feira, 27 de abril de 2009

M.F.A.-grupo de assassinos.

Armando Manuel chegou para beber a sua cuca,era noite e estava quase na hora de fechar.
O Armando era mais do que um cliente,era um amigo do meu velho,era uma visita diária da pensão Oliveira da Gabela,onde anos a fio,foi um dos elementos do grupo da sueca,juntamente com o meu pai,o Viegas e o Heitor Martins.Mas o Armando era também o responsável pela escrita das empresas do meu pai.
Veio o 25 de Abril de 75 e muita das rotinas começaram a ser alteradas ,o Armando começou a ser um visitante,cada vez mais ausente,não porque se alterou a amizade,mas porque outros mais altos valores se levantaram.
O Armando era um dos dirigentes do MPLA na Gabela e apesar de saber que o meu pai era um simpatizante da UNITA,isso nunca foi um empecilho na relação deles,já que tinham uma vivência de muitos anos juntos,que os tornava amigos e nunca adversários.
Lembro-me dessa noite,pois tinha-me habituado a ver o Armando todos os dias e agora era muito raro -lo.
Não tinha a verdadeira noção,do que estava a acontecer em Angola,pois ao contrário das outras cidades,que já estavam a ferro e fogo,na Gabela estava tudo,aparentemente ,na santa paz do senhor.Na inocência dos meus 12 anos,não alcançava a razão pela qual,a maior parte dos meus vizinhos,estavam a embalar os seus haveres,que foi coisa que o meu pai nunca fez,pois para ele a sua terra era Angola,Portugal ou o Puto como se dizia,era já uma recordação muito distante,que ele desejava um dia ir visitar,mas nunca mais pensava em regressar.
Nessa noite ,o Armando convidou o meu pai para ir com ele,a uma fazenda,que era uma espécie de quartel do MPLA.
Depois de algumas cucas e de muito se falar sobre o que estava a acontecer em Angola,o Armando Manuel virou-se para o meu pai e disse:
-Sousa,não vás embora,está é a tua terra.
Ao que o meu pai respondeu:
Não posso arriscar,tenho três filhos menores(a minha mãe já tinha falecido) e todos os meus vizinhos,estão a prepararem-se para rumar até Portugal.
Penso que foi a última vez,que vi o Armando Manuel,pois passados alguns dias,também a Gabela ficou a ferro e fogo e a nós só nos restou um caminho,fugir em direcção ao aeroporto mais perto,para mais depressa fugir,daquele inferno,porque pior do que fugir das arbitrariedades dos diversos movimentos angolanos(MPLA,UNITA e FNLA)era ter a certeza que o MFA era um grupo de ladrões vestidos com a farda portuguesa.
Aqueles que se denominavam,como a sentinela do povo,foram coniventes com verdadeiros assassínios,violações e humilhações que foram cometidas sobre a população de origem portuguesa e que eu saiba,nunca nenhum desses filhos da mãe foi julgado ,não só por não terem feito o seu trabalho,que era proteger a sua gente,como foram os principais salteadores,que roubaram tudo que havia para roubar e isso ninguém me disse,eu vi quem andava a assaltar as lojas na Gabela,depois de terem caído os primeiros morteiros e que partiram os vidros das montras.
Isto é apenas um episódio,contado por quem viveu a trágica descolonização portuguesa,na pele,cuja memória não se apaga.

3 comentários:

septuagenário disse...

Só foi feita a guerra que estava ao alcance do povo português, e só foi feita a paz que estava tambem ao nosso alcance.

E quem faz o que pode a mais não é obrigado.

E essa coisa de não nos respeitarmos uns aos outros e até sermos desunidos e oportunistas é do carácter, paciência!

Mas é bom que se escreva o que se passou, porque ainda vai levar muitos anos até a história se compreender.

Anónimo disse...

E é bom que a memória não se apague, para que possamos algum dia vir a saber o que realmente se passou.

septuagenário disse...

Se fosse possível saber o nome completo do Armando Manuel e idade, talvez pudesse ouvir algumas estorietas bem interessantes!